Na formação de uma sociedade empresária, são muitos os trâmites legais a serem seguidos e cada vez mais ganha relevância a qualidade do contrato social que rege a empresa.
Para dar início às atividades empresariais, muitas vezes os sócios permitem que profissionais pouco qualificados elaborem tal documento, de maneira simples e ágil, ignorando sua importância para situações futuras que venham surgir na vida da sociedade.
Você sabia que o contrato social influencia até mesmo na dissolução parcial da empresa ou quando da saída de um sócio do negócio?
Quando não há previsão no contrato social sobre a forma justa de cálculo dos haveres do sócio retirante e o impacto de tal retirada no fluxo de caixa da empresa, a discussão vai parar no judiciário para que decida sobre a matéria.
E foi isso que fez o recente julgado do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) que apresentou entendimento quanto à forma de calcular o valor da quota empresarial do sócio retirante com base no balanço especial de determinação, desconsiderando os lucros futuros da sociedade.
Isso pode decorrer de inúmeros motivos que, na prática, geralmente não interferem de maneira direta na metodologia do cálculo.
Quando ocorre a retirada de um sócio, deve existir a apuração dos haveres correspondentes às quotas a ele vinculadas – mas como realizar o cálculo desses valores quando não há previsão no contrato social?
É nesse momento que, quase sempre, ocorrem discordâncias sobre o método de apuração de tais valores, já que existem algumas formas de realizar a avaliação da sociedade e, consequentemente, das quotas pertencentes ao sócio que está de saída da empresa.
De acordo com o método a ser adotado, os valores variam consideravelmente, o que pode gerar litígios judiciais. Por isso, é importante conhecer as formas de avaliação mais utilizadas e o entendimento do TJSP sobre o tema.
Neste ponto, reside a principal discordância, já que qualquer empresa pode ser avaliada por critérios diferentes com a obtenção de valores diversos. Mas, aqui iremos priorizar os seguintes: valor econômico e valor patrimonial.
Assim, vamos apresentar as características das metodologias existentes para estabelecer suas distinções e formas de funcionamento.
De forma sucinta, é a avaliação da empresa não apenas do momento passado e presente, mas também do seu futuro, do qual se obtém o valor econômico do negócio.
É calculado, portanto, o potencial de lucratividade da empresa, utilizando projeções de fluxos de caixa em médio e longo prazo, com base na sua taxa de crescimento e na avaliação do próprio mercado em que está inserida. Em síntese, busca-se definir o quão lucrativa será a sociedade no futuro seguindo projeções existentes.
Uma desvantagem desse método é justamente sua imprecisão – ainda que as estatísticas e análises de riscos e de mercado sejam previsíveis, bastará uma alteração inesperada no cenário macroeconômico para que as projeções de resultado sejam diversas.
Indica-se, portanto, a adoção desse método para empresas maiores, que já estão consolidadas e apresentam dados mais robustos para a avaliação, além de estarem menos suscetíveis às alterações mercadológicas.
Serve, ainda, como base de estudo adotado por muitas empresas para a tomada de decisões importantes, como nos casos de novos investimentos e obtenção de financiamentos, justamente por mirar o sucesso futuro do negócio.
Em resumo, considerar-se-á os custos operacionais, as receitas da sociedade, o gasto de capital projetado e o seu crescimento em determinado período.
Inicialmente, é preciso definir a estimativa do fluxo de caixa futuro da empresa, ou seja, a apuração da entrada e saída de dinheiro da sociedade – é recomendável a utilização do próximo quinquênio como base, buscando dados mais previsíveis e que, ao mesmo tempo, ofereçam uma boa perspectiva.
Em posse desses números, o próximo passo é a definição da taxa de desconto, baseada nos riscos e custos do capital. Essa taxa de desconto visa aproximar da realidade atual a projeção futura obtida.
Para definir o valor presente de todos os fluxos, utiliza-se, em regra, a seguinte fórmula:
FCD = Fluxos de Caixas Futuros / (1 + Taxa de Desconto) número de períodos.
Diante de tantas variáveis, sem prejuízo da subjetividade quanto à taxa de desconto aplicável, todos diretamente ligados à rentabilidade de cada setor empresarial, é sempre importante contar com um especialista em avaliação de empresas para realizar os cálculos necessários.
O balanço especial de determinação, por sua vez, tem por objetivo determinar o valor patrimonial da empresa no momento presente, de modo a aferir seu valor real.
Para isso, simula-se a dissolução e a liquidação da sociedade – como se ela fosse encerrar as operações totalmente – com a realização de todos os ativos e satisfação de todos os passivos. Assim, obtém-se o valor patrimonial da empresa e o cálculo da cota pertencente ao sócio retirante estaria mais próximo do valor de mercado.
É importante saber que o direito privado privilegia o contrato social como a “lei” que deve ser observada nos assuntos relacionados à sociedade limitada – contanto que não contrarie a própria legislação.
Ocorre que a escolha prévia do critério ou método de apuração de haveres deve levar em consideração, dentre outros aspectos relevantes, o tipo de atividade empresarial desenvolvida pela empresa. Isso porque a avaliação decorrente de tal escolha pode prejudicar não só os resultados da dissolução parcial, mas a própria continuidade da sociedade.
Portanto, recomenda-se o auxílio de especialistas para a elaboração ou alteração do contrato social, prevendo o cálculo a ser seguido na apuração de haveres.
Mas, inexistindo disposição expressa no contrato social sobre o aludido tema, a construção jurisprudencial vem sendo firmada no sentido de que devem se aplicáveis os artigos 606 do Código de Processo Civil (CPC) e 1.031 do Código Civil (CC), que assim preconizam:
Art. 606 do CPC: Em caso de omissão do contrato social, o juiz definirá, como critério de apuração de haveres, o valor patrimonial apurado em balanço de determinação, tomando-se por referência a data da resolução e avaliando-se bens e direitos do ativo, tangíveis e intangíveis, a preço de saída, além do passivo também a ser apurado de igual forma.
Art. 1.031 do CC: Nos casos em que a sociedade se resolver em relação a um sócio, o valor da sua quota, considerada pelo montante efetivamente realizado, liquidar-se-á, salvo disposição contratual em contrário, com base na situação patrimonial da sociedade, à data da resolução, verificada em balanço especialmente levantado.
Da leitura dos dispositivos, conclui-se que deverá ser obtido o valor patrimonial através de balanço especial (de determinação).
No caso concreto (apelação nº. 1000712-41.2015.8.26.0068), a 1ª Câmara Reservada de Direito Empresarial do Tribunal de Justiça de São Paulo tentou estabelecer uma via pacificada de entendimento que tende a diminuir os litígios judiciais ou, ao menos, oferecer uma base mais sólida para apuração de haveres do sócio retirante.
Para isso, decidiu-se que o valor da quota, a ser apurada na dissolução parcial da sociedade limitada, deve ser calculado tendo com base o valor patrimonial, mediante balanço de determinação, o qual considera o histórico de resultados da sociedade até o momento da saída do sócio, descartando os resultados futuros.
De acordo com os desembargadores, reconhecer a participação do sócio retirante nos lucros futuros da sociedade, sem participar dos riscos do empresa, é incompatível com a lógica da atividade empresarial, em que o lucro é a contrapartida direta do risco do negócio. Em suma, não se pode admitir a participação de sócio retirante nos lucros futuros sem que participe do risco da própria atividade empresarial.
Ainda quanto ao caso concreto em análise, destacou-se que o contrato social existente entre os sócios previa como base de apuração de haveres um balanço patrimonial extraordinário, o que prestigiou, no entendimento dos juízes, o critério patrimonial contábil em harmonia com as diretrizes dos artigos 606 do CPC e 1.031 do CC.
Diante dessas principais justificativas, o TJSP descartou a metodologia do fluxo de caixa descontado que está associada à aferição do valor econômico (e não patrimonial) da sociedade, diante do seu elevado grau de incerteza, baseado em projeções futuras que podem, ou não, serem confirmadas.
Tal entendimento está afinado com o Superior Tribunal de Justiça, conforme Recurso Especial julgado no ano de 2019 – Resp 1.877.331/SP.
Se você busca se prevenir de brigas entre sócios ou resolver uma controvérsia envolvendo a retirada de sócio da sociedade limitada, é importante contar com um especialista para encontrar a melhor solução para sua empresa.
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